quinta-feira, 29 de agosto de 2013

ESTUDO-23 A VERDADEIRA ESPIRITUALIDADE

ESTUDO-23 A VERDADEIRA ESPIRITUALIDADE

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ESTUDO-23

A VERDADEIRA ESPIRITUALIDADE

INTRODUÇÃO

Até aqui Marcos descreveu cinco confrontações entre Jesus e os líderes. Eles o acusaram de assumir prerrogativas divinas (2.7), relacionar-se com pessoas “ruins” (2.16), permitir que os seus discípulos “não guardassem” o sábado (2.24), de ele mesmo não guardar o sábado (3.2,6) e expulsar demônios por Belzebu (3.22). Esta confrontação, agora, centra-se ao redor de uma questão básica (7.5): “O que deve regular a vida: A tradição humana ou a Palavra de Deus?” A resposta de Jesus deu ensejo a que Jesus ensinasse acerca da verdadeira espiritualidade.


I. A ACUSAÇÃO – v. 1-5

1. A identidade dos acusadores – v. 1

Os escribas e fariseus eram os guardiões da tradição judaica. Eles eram farejadores de heresias. Eles eram detetives da vida alheia. Por onde quer Jesus andasse, eles estavam espreitando-o para encontrar alguma heresia para o acusador.

William Hendriksen diz que os escribas eram os especialistas da lei. Eles a estudavam, interpretavam e a ensinavam ao povo. Mais exatamente eles transmitiam para sua própria geração as tradições, que de geração em geração, tinham sido passadas com respeito à interpretação e aplicação da lei. Essas tradições tinham tido sua origem no ensino de rabinos veneráveis do passado. Os fariseus, por sua vez, eram aqueles que tentavam fazer todos crerem que eles, os separatistas, estavam vivendo, de acordo com o ensino dos escribas.


2. A prática dos acusadores – v. 3,4

A tradição dos anciãos correspondia a uma coleção de preceitos, adicionais à Lei de Moisés, que pretendia guiar o israelita na aplicação dos mandamentos através das variadas circunstâncias da vida. Segundo os rabinos, Moisés havia dado estes preceitos oralmente aos anciãos de Israel, os quais haviam transmitido do mesmo modo às gerações sucessivas.

Os escribas e fariseus transformaram a vida espiritual num fardo pesado com muitas regras e normas. Eles pensavam que da observância dessas muitas e detalhadas regras e cerimônias de purificação dependia a própria salvação deles. Eles chegavam ao extremo de toda vez que iam à praça ou ao mercado, ao voltarem para casa, purificavam o vasilhame e até as camas. Por ser a praça um centro de reunião de muitas pessoas, julgavam-na impura; além do mais, podiam esbarrar num gentio impuro. Assim, os judeus precisavam se purificar toda vez que chegavam em casa.


3. A pergunta dos acusadores – v. 5

Os fariseus e escribas estão escandalizados porque os discípulos de Cristo não purificavam as mãos para comer nem mesmo prestavam obediência à tradição dos anciãos. Essa acusação tinha o propósito de atingir a Cristo. Eles seguiam rituais vazios e queriam que os outros fizessem o mesmo. Eles estavam cegos e queriam conduzir os outros cegos para o abismo.

Essa lavagem de mãos nada tinha a ver com higiene pessoal ou a ordenança da lei, mas apenas com a tradição dos escribas e fariseus. Isso era mais um fardo que eles inventaram para o povo carregar (Mt 23.4).

Esses líderes religiosos cometeram dois grandes equívocos:

Em primeiro lugar, eles pensavam que por observar esses ritos eram melhores que os outros. Eles tinham um alto conceito de si mesmos. Eles eram jactanciosos e se julgavam mais santos, mais puros, mais dignos que as demais pessoas.

Em segundo lugar, eles estavam enganados quanto à natureza do pecado. A santidade é uma questão de afeição interna e não de ações externas. Eles pensavam que eram santos por praticarem ritos externos de purificação. O contraste entre os fariseus e escribas e os discípulos de Cristo não era apenas entre a lei e os ritos, entre a verdade de Deus e a tradição dos homens, mas uma divergência profunda sobre a doutrina do pecado e da santidade. Este conflito não é periférico, mas toca o âmago da verdadeira espiritualidade. Ainda hoje, muitos segmentos evangélicos coam mosquito e engolem camelo. Os escribas e fariseus em nome de uma espiritualidade sadia negligenciaram o mandamento de Deus (7.8), jeitosamente rejeitaram o preceito de Deus (7.9) e invalidaram a Palavra de Deus (7.13).


II. A REFUTAÇÃO – v. 6-13

1. Jesus descreve o caráter dos acusadores – v. 6

Jesus chama os seus contendores de hipócritas. O hipócrita é um ator, ele desempenha o papel de uma outra pessoa. Ele não é quem aparenta ser. Os lábios são de uma pessoa, mas o coração é de outra. John Charles Ryle alerta para o perigo de estarmos fisicamente na igreja e deixarmos nosso coração em casa, de sermos uma pessoa aqui e outra acolá.

William Barclay diz que a palavra hypokrites tem uma história interessante e reveladora. Começa significando simplesmente uma contestação; para significar logo aquele que contesta num diálogo ou um ator teatral, e finalmente significa alguém cuja vida é uma atuação sem nenhuma sinceridade. O hipócrita é o homem que esconde, ou tenta esconder suas intenções reais por trás de uma máscara de virtude simulada.

O hipócrita é aquele que fala uma coisa e sente outra. Há um abismo entre suas palavras e seus sentimentos, um hiato entre suas ações e seu coração, uma esquizofrenia entre seu mundo interior e o exterior.

William Hendriksen diz que um hipócrita é um enganador, fraudulento, impostor, uma serpente sobre a relva, e um lobo em pele de cordeiro. Ele finge ser o que, na verdade, não é.


2. Jesus revela a inversão de valores dos acusadores – v. 8

Os escribas e fariseus proclamavam ser defensores da ortodoxia. Mas o zelo deles não era em preservar e proclamar a Palavra de Deus, mas em manter a tradição dos anciãos. Eles haviam trocado a verdade pela mentira. William Hendriksen diz que eles eram culpados de colocar a mera tradição humana acima do mandamento divino, uma regra feita pelo homem acima de um mandamento dado por Deus. Os rabinos haviam dividido a Lei Mosaica, ou Torá, em 613 decretos distintos, com 365 deles sendo considerados proibições, enquanto 248 eram orientações positivas. Além disso, em conexão com cada decreto, haviam desenvolvido distinções arbitrárias entre o que consideravam “permitido”, e o que “não era permitido”. Por meio dessas distinções, eles tentavam regular cada detalhe da conduta dos judeus: seus sábados, viagens, comida, jejuns, abluções, comércio, relações interpessoais, etc.


3. Jesus aponta os desvios dos acusadores – v. 7-13

Os escribas e fariseus, tentando reprovar os discípulos de Cristo, para destruí-lo, foram denunciados de cometer vários desvios na prática da verdadeira espiritualidade:

Em primeiro lugar, o culto deles era em vão (7.7). Jesus responde os escribas e fariseus citando para eles a lei e os profetas, ou seja, Isaías 29.13 e Êxodo 20.12. A autoridade não está nos escritos dos rabinos, mas na Palavra de Deus. O culto só é verdadeiro quando é regido pela verdade de Deus e pala sinceridade de coração. Palavras bonitas sem verdade no íntimo desagradam a Deus. É uma grande tragédia que pessoas religiosas, ignorantemente, praticam sua religião e se tornam ainda piores.

Em segundo lugar, eles negligenciam o mandamento de Deus (7.8). Os escribas e fariseus eram culpados de colocar a mera tradição humana acima do mandamento divino, uma regra feita pelo homem acima de um mandamento dado por Deus. Eles deturparam o mandamento de Deus para manter a tradição dos homens. Eles deram mais valor à sua tradição oral do que a Palavra escrita de Deus.

Em terceiro lugar, eles rejeitaram jeitosamente o preceito de Deus (7.9-12). Os escribas e fariseus chegaram ao ponto de anular e invalidar um preceito infalível de Deus para confirmar sua tradição fraca e miserável. Jesus fala sobre o arranjo jeitoso que os rabinos fizeram para deturpar a quinto mandamento e liberar os filhos avarentos da responsabilidade de cuidarem de seus pais na velhice. Esses líderes proclamavam amar a Deus, mas não tinham amor pelos pais. O mandamento para honrar pai e mãe está fartamente documentado nas Escrituras. Honrar pai e mãe é mais do que simplesmente obedecer-lhes. O que realmente importa é a atitude interior do filho em relação aos seus pais. Essa atitude é o que, na verdade, produz honra. Toda obediência interesseira, relutante, ou produzida pelo terror é, descartada. Honra implica amor e alta consideração.

Como os escribas e fariseus anularam esse preceito bíblico? Pela errada aplicação da lei de Corbã. Quando um filho mal tinha a intenção de desamparar pai e mãe, sonegando a eles a assistência devida, dizia a eles que não podia ajudá-los, porque haviam dedicado esses recursos financeiros como oferta ao Senhor. Desta maneira ficavam “legalmente” isentos de socorrer os pais e não necessariamente, dedicavam essas ofertas a Deus. O filho que declarava: É Corbã, poderia, simplesmente, conservar o dom para seu próprio uso. Ernesto Trenchard coloca essa questão como segue:

A palavra Corbã quer dizer “dedicado a Deus”, e se empregava quando um homem queria dedicar seus bens à tesouraria do Templo. Mas, por um acordo com os sacerdotes israelitas, podia “dedicar” seu dinheiro ou sua propriedade ao Templo, ao mesmo tempo, que desfrutava deles durante a sua vida, deixando-os como um legado a serviço do Templo. Caso este homem, segundo a santa obrigação natural e legal, tivesse o dever de manter os pais idosos ou enfermos, os mesmos sacerdotes lhe impedia de ajudá-los com esses fundos que eram “Corbã”, para não subtrair o levado do Templo. Este caso suscitou a justa indignação do Senhor, pois por um ímpio subterfúgio, e sob uma aparência de piedade, se violava um dos principais mandamentos de Deus.

Em quarto lugar, eles invalidaram a Palavra de Deus (7.13). Os escribas e fariseus estavam não apenas ignorando, mas também invalidando a Palavra de Deus. Eles estavam retirando a autoridade divina do quinto mandamento. Por outro lado, estavam colocando em seu lugar uma tradição injusta e iníqua. Jesus deixa claro que a oferta de Corbã era apenas um exemplo dos muitos desvios desses falsos mestres.

O grande pilar da ortodoxia evangélica é a verdade de que a Palavra de Deus é nossa única regra de fé e prática. Esse marco tem sido removido ainda hoje. Preceitos de homens têm sido colocados no lugar da bendita Palavra de Deus.


III. O PRECEITO – v. 14-16

1. A contaminação vem de dentro e não de fora – v. 15

A verdadeira espiritualidade não é ritual nem cerimonial, mas procede da sinceridade do coração. Não é o que homem põe para dentro, mas o que sai do seu coração. Esse preceito de Jesus tem duas implicações:

Em primeiro lugar, Jesus refuta a ideia de que o homem é produto do meio. O mal não vem de fora, mas de dentro. O mal não está no ambiente, mas no coração. Jean Jacques Rousseau estava equivocado ao ensinar que o homem é bom por natureza. Jesus de Nazaré, o maior de todos os mestres, revela a maldade inerente do ser humano.

Em segundo lugar, Jesus refuta a ideia de que o ritualismo externo pode nos tornar agradáveis aos olhos de Deus. Lavar as mãos ou purificar utensílios não nos torna limpos aos olhos de Deus. Ele não atenta para a aparência, mas vê o coração. Ele busca verdade no íntimo.


2. Em vez de purificações cerimoniais devemos afiar nosso entendimento e nossos ouvidos – v. 14,16

Em vez de ser um prisioneiro do legalismo farisaico, Jesus exorta a multidão a ter uma espiritualidade governada pelo entendimento da verdade de Deus. Jesus dá uma grande ênfase à necessidade de ouvir e compreender. Não podemos seguir interpretações enganosas, antes devemos inclinar nossos ouvidos à Palavra de Deus.


IV. EXPLICAÇÃO – v. 17-23

1. A verdadeira pureza tem a ver com o coração e não com o estômago – v. 18-20

Jesus está acabando com a paranoia da religião legalista das listas intermináveis do pode e não pode. Jesus está declarando puros todos os alimentos. Não podemos considerar impuro o que Deus tornou puro (At 10.15). O alimento desce ao estômago, mas o pecado sobe ao coração. O alimento que comemos é digerido e evacuado, mas o pecado permanece no coração, produzindo contaminação e morte.


2. Os grandes males procedem do coração e não do ambiente externo – v. 21-23

Jesus aponta o coração como a fonte dos sentimentos, aspirações, pensamentos e ações dos homens. Essa fonte é, também, a fonte de toda contaminação moral e espiritual. Jesus não tinha ilusões sobre a natureza humana como alguns teólogos liberais e mestres humanistas da atualidade.

Marcos cita doze pecados que brotam do coração. Os seis primeiros estão no plural e os outros no singular. Os primeiros seis indicam más ações, enquanto os últimos seis falam do estado do coração, do direcionamento maligno, bem como das palavras que são relacionadas a essas ações. Há outras listas de pecados registradas no Novo Testamento.

O termo introdutório “os maus desígnios”, dialogismoi, literalmente significa “os maus diálogos”. Uma pessoa está quase sempre dialogando em sua própria mente, arrazoando, cogitando, deliberando. Esses diálogos provocam ações e estimulam o estado interior.

Vejamos em primeiro lugar, as seis ações pecaminosas.

Prostituição – O termo pornéia indica o pecado sexual em geral, todo comportamento sexual ilícito, seja dentro ou fora do casamento. A prostituição inclui a pornografia, a fornicação, o adultério, o homossexualismo, bem como, toda impureza moral.

Furtos - Na língua grega há duas palavras para furto: kleptes e lestes. Lestes é o bandoleiro, assaltante. Barrabás era um destes (Jo 18.40). Kleptes é um ladrão. Judas era um ladrão quando subtraía da bolsa (Jo 12.6). A palavra usada aqui é klopai. O furto é a apropriação indébita daquilo que não nos pertence. É a retenção intencional daquilo que pertence a outro: seja o governo civil, o próximo, ou mesmo Deus.

Homicídios - Inclui tanto o ato como o desejo de tirar a vida do próximo. Este pecado inclui tanto o ódio, como o assassinato e bem como o aborto.

Adultérios - Esta é a violação dos laços do matrimônio, envolvendo um ato sexual voluntário entre um homem e uma mulher com uma pessoa que não é o seu cônjuge. Jesus ampliou a transgressão desse pecado para o olhar cobiçoso (Mt 5.28).

Avareza - Avareza é um apego idolátrico às coisas materiais, sonegando toda sorte de ajuda ao próximo nas suas necessidades. O termo usado é pleonexiai, o desejo ardente de ter o que pertence a outros. A ganância é como uma peneira que nunca fica cheia.

As malícias - Isto poderia muito bem ser um somatório de todas as manifestações iníquas, tanto as já mencionadas quanto as outras.

Vejamos em segundo lugar, os pecados que retratam o estado do coração:

Dolo - O dolo pode ser definido como artimanhas do engano.

Lascívia - Impulso pecaminoso como luxúria e licenciosidade.

Inveja - É o desprazer de ver uma pessoa possuir algo. William Hendriksen diz que esse é um dos pecados mais destrutivos da alma. Ela é como podridão nos ossos (Pv 14.30). Nossa palavra inveja vem do latim in-video, que significa “olhar contra”, ou seja, olhar com má vontade para uma outra pessoa por causa do que ele tem ou é. Foi a inveja que provou a morte de Abel, jogou José no poço, provocou a revolta de Core, Datã e Abirão, levou Saul a perseguir Davi, gerou as palavras rancorosas do “irmão mais velho” do pródigo e crucificou Jesus.

Blasfêmia - Palavras abusivas e difamações. Refere-se à difamação do caráter, ao xingamento, à calúnia, linguagem desdenhosa ou insolente dirigida contra outra pessoa, seja diretamente para ela, ou pelas suas costas.

Soberba - A tendência maligna de imaginar-se melhor, mais hábil ou maior do que os outros.

Loucura - William Hendriksen diz que esse termo resume as cinco propensões e palavras anteriores.


CONCLUSÃO.

O remédio é um novo coração. É mais difícil ter um coração limpo do que mãos limpas. De fato, é impossível ter uma vida aceitável a Deus, com nossos corações contaminados longe de sua graça purificadora. O evangelho trabalha de dentro para fora, provendo a motivação interna necessária para adquirir caráter justo e para livrar-se “de toda impureza e acúmulo da maldade” (Tg 1.21).


Rev. Hernandes Dias Lopes

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